vexilologia, heráldica e história

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Dez 16

Um laço nacional é um tipo de distintivo que se apresenta sob a forma de um laço de fitas ou sob uma forma circular ou oval, contendo as cores nacionais de um estado e que serve de emblema nacional ao mesmo, sendo normalmente usados em coberturas de cabeça. Para além de emblemas nacionais, os laços podem servir também de emblemas regionais, políticos ou outros. Os laços são também referidos como topes, rosetas ou cocares.

Originalmente, os laços nacionais eram verdadeiros laços feitos de fitas de tecido colorido. Posteriormente passaram a ser preferencialmente representados como rosetas ou círculos coloridos, feitos inicialmente de tecido, mas posteriormente também de outros materiais como o metal ou o plástico. Como emblemas nacionais, os laços são também representados pintados em vários suportes, como é caso das asas e fuselagem de aeronaves.

Na sequência da Revolução Francesa, os laços nacionais tornaram-se no principal emblema nacional dos diversos países e estados da Europa. Muitos dos laços nacionais da época serviram de inspiração para as bandeiras nacionais, as quais adotaram as respetivas cores durante o século XIX. Depois de passarem a incluir as cores nacionais, as bandeiras assumiram gradualmente a posição de principal emblema dos países, em detrimento dos respetivos laços, que foram passando para segundo plano, em alguns casos caindo mesmo no esquecimento.


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 Laço Nacional Português

O mesmo aconteceu em Portugal. A partir do início do século XIX, o laço português - na época azul e escarlate - tornou-se talvez no principal emblema nacional, generalizando-se o seu uso popular como símbolo patriótico durante a Guerra Peninsular. Com o estabelecimento do regime constitucional e a identificação da necessidade de encontrar um símbolo que representasse verdadeiramente a nação e não a monarquia, a atenção dos deputados portugueses focou-se no estabelecimento de um novo laço nacional, não havendo preocupação em mudar a bandeira ou o brasão de armas. O novo laço adotado 1821 passou o a ser das cores azul e branca. Em 1830, a própria Bandeira Portuguesa foi alterada passando a ter as mesmas cores azul e branca do laço nacional. Em 1910, quando foram introduzidos novos símbolos nacionais na sequência da implantação da república, já não foi dada atenção ao estabelecimento formal de um laço nacional. No entanto, o mesmo foi implicitamente estabelecido no âmbito dos vários planos de uniformes militares, policiais e de outras instituições. As posteriores reformas dos planos de uniformes, levaram contudo ao desaparecimento gradual dos laços nacionais dos mesmos, a partir da década de 1930, hoje em dia praticamente apenas subsistindo na barretina do uniforme de gala do Colégio Militar.

Apesar da sua importância passada, o Laço Nacional Português é hoje em dia desconhecido pela maioria da população portuguesa e - ainda menos - apreendido pela mesma como um símbolo nacional. Este artigo fala sobre a evolução dos laços em geral e do laço nacional português em particular. Será uma modesta contribuição para que os portugueses conheçam melhor este símbolo e que assim possam fazer ressurgir a sua utilização.

A origem e evolução dos laços nacionais 

Origens

Podemos encontrar a origem remota dos laços nacionais no século XVII, quando cores específicas aparecem associadas a alguns estados europeus e são usadas como distintivos de nacionalidade pelas respetivas tropas. Uma das principais formas de exibição das cores nacionais era a seu uso nas bandas (lenços) levadas à cintura ou a tiracolo pelos oficiais militares. Assim, os oficiais das tropas de Espanha previligiam o uso de bandas vermelhas, os de França bandas brancas, os dos Países Baixos bandas laranja e os de Portugal bandas verdes.

O primeiro uso confirmado de laços nacionais ocorre durante a Guerra da Sucessão de Espanha, travada entre 1701 e 1715. Durante este conflito, os militares dos exércitos borbónicos adotam o uso, nas suas coberturas de cabeça, de laços de fita nas respetivas cores nacionais. Assim, os militares franceses usam laços de fita branca e os militares espanhóis usam laços de fita vermelha. Apesar de não confirmado, é possível que o uso de laços com as cores nacionais tenha também sido feito pelas tropas da Grande Aliança que se opunha à fação borbónica.

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 Laços borbónicos usados na Guerra da Sucessão de Espanha. O laço branco francês foi usado até à Revolução Francesa, depois restaurado e definitivamente abolido em 1830. O laço vermelho espanhol foi usado até 1871

Ao longo do século XVIII, para além dos exércitos franceses e espanhóis, há algumas notícias de outros usos de laços como distintivo nacional, político ou outro. No entanto, o seu uso ainda não é generalizado. Apesar do laço ser um componente dos tricórnios usados pelos militares da maioria dos países, normalmente este é apenas usado como um mero enfeite, sendo na maioria das vezes preto, sem qualquer significado emblemático.

A Cocar Tricolor da Revolução Francesa

A importância dos laços de fita como emblema irá efetuar-se na sequência da Revolução Francesa ocorrida em 1789. Durante o período revolucionário, os laços tornar-se-ão muito populares e serão usados como um dos principais tipos de distintivo político e nacional. É previligiado o uso de laços em forma de roseta, constituídos por círculos concêntricos de várias cores, os quais são conhecidos como cocares (cocardes em francês).

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Cartaz francês de 1792, proibindo a entrada de pessoas sem cocar. No cartaz aparece o barrete frígio com a cocar tricolor, dois dos principais símbolos da Revolução Francesa. A ordem das três cores da cocar variou até se fixar no exterior vermelho, intermédio branco e centro azul

Por solicitação do líder revolucionário Camille Desmoulins, os seus partidários adotam o uso de cocares verdes a 12 de julho de 1789. Estes usam as cocares verdes durante a tomada da Bastilha a 14 de julho. Por outro lado, a Milícia de Paris formada a 13 de julho, adota cocares vermelhas. Quando da presença do Rei Luís XVI nos paços municipais de Paris a 17 de julho, é-lhe apresentada uma cocar azul e vermelha (cores heráldicas de Paris), que o mesmo coloca no seu chapéu. Laffayete sugere que, à cocar azul e vermelha de Paris, seja acrescentada a cor branca do anterior laço real francês a fim de a tornar numa cocar nacional. Finalmente, a cocar azul-branca-vermelha é adotada pela Guarda Nacional a 27 de julho, nascendo assim a famosa Cocarde tricolore (Cocar Tricolor), que se tornará num dos principais símbolos nacionais e revolucionários franceses.

As cores da Cocar Tricolor servem de inspiração para um outro importante símbolo da França, que será a sua nova bandeira. A 24 de outubro de 1790, a Assembleia Constituinte Francesa decreta a adoção de uma nova bandeira nacional, constituída pelas cores azul-branca-vermelha já usadas na cocar, a qual ficará conhecida como Drapeau tricolore (Bandeira Tricolor).

Durante as guerras revolucionárias e napoleónicas, que irão travar-se entre 1792 e 1815, os laços de fita popularizam-se como emblema patriótico em toda a Europa. Vários estados formalizam modelos oficiais de laço nacional, para uso obrigatório nas coberturas de cabeça dos uniformes dos militares e de certas categorias de funcionários públicos, os quais são também usados frequentemente de forma voluntária pelos civis, como forma de demonstração de patriotismo. Os estados clientes ou partidários do regime revolucionário francês tendem previligiar o uso de cocares tricolores, quer quer adotando as próprias cores azul-branca-vermelho da cocar francesa (como as repúblicas Subalpina e Tiberina), quer substituindo-as por outras distintas (como as repúblicas Helvética e Italiana). Em reação aos revolucionários, os países opositores ao regime francês adotam também laços nacionais, neste caso tendendo a preferir laços monocolores ou bicolores. As cores escolhidas para os laços nacionais têm diversas origens, incluindos cores dos símbolos heráldicos, cores dos librés das casas reais ou cores tradicionais associadas aos respetivos estados ou dinastias reinantes.

Generalização do uso de laços nacionais

Na sequência do período revolucionário, o laço nacional irá preencher um vazio criado pela perceção da falta de um verdadeiro emblema nacional na maioria dos estados europeus. Até então, os principais emblemas dos estados eram os seus brasões de armas e outros símbolos heráldicos, mas estes eram agora vistos apenas como emblemas das respetivas dinastias reinantes e não como verdadeiros símbolos representativos do conjunto da nação. Por outro lado, as bandeiras da maioria dos estados eram então meros suportes dos respetivos símbolos heráldicos (por essa razão, muitas delas eram simplesmente brancas, com os símbolos heráldicos ao centro)  e por isso também ainda não podiam ser vistas como verdadeiros símbolos nacionais. Os laços nacionais irão então responder a essa falta, sendo adotado como os principais distintivos de nacionalidade dos países europeus e também dos novos países sul-americanos surgidos nessa altura. Ao longo do século XIX, cada vez mais é preferido o uso de laços circulares, onde as diversas cores são representadas como círculos concêntricos. 

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Laços nacionais do Império Alemão e dos diversos estados seus constituintes, no início do século XX

Nalguns estados, as cores dos respetivos laços tornam-se tão populares que passam a ser amplamente usadas nas mais diversas aplicações. Na Alemanha, um dos locais onde os laços nacionais são mais populares, sendo adotados pelos seus diversos estados, as cores daqueles são pintadas nos marcos fronteiriços, nas cancelas ds estradas, nas guaritas dos quarteis e até nos postes dos candeeiros. 

A exemplo do que já havia acontecido já na França revolucionária, os laços nacionais de muitos países europeus seriam os percussores das respetivas bandeiras nacionais. Durante a primeira metade do século XIX, muitos países decidem adotar novas bandeiras nas cores dos respetivos laços nacionais, a fim das mesmas passarem a poder ser consideradas como verdadeiras bandeiras nacionais e já não como meros suportes dos brasões de armas das dinastias reinantes. Assim, aparecem inúmeras bandeiras multicoloridas, que substitutem muitas das antigas bandeiras monocolores com brasões ao centro usadas até então. As novas bandeiras constituídas pelas cores nacionais passam gradualmente a assumir o lugar de principal símbolo nacional, em detrimento dos laços nacionais. No final do século XIX, as bandeiras são já vistas como o principal símbolo dos países, deixando os laços nacionais em segundo plano.

Em 1912, a Aeronáutica Militar Francesa adota a Cocar Tricolor como distintivos de nacionalidade das suas aeronaves, as quais passam a levá-la pintada no dorso e intradorso das asas. Este novo uso da cocar serve de inspiração para inúmeros outros países, sobretudo a partir da Primeira Guerra Mundial. Assim, muitas aviações militares nacionais adotam cocares com as cores nacionais, sendo que este tipo de emblema é ainda hoje o mais comum modelo de destintivo aeronáutico de nacionalidade em uso pelas várias forças aéreas nacionais.

Apesar de perder o lugar de principal emblema nacional, o laço nacional mantém-se em uso nos uniformes militares de muitos países até depois da Segunda Guerra Mundial. Nesta altura os laços nacionais usados nos uniformes de uso corrente são frequentemente feitos de material metálico ou plástico, sendo os laços de tecido restringidos aos uniformes de gala.

No início do século XXI, os laços nacionais ainda constituem ainda um emblema importante presente nos uniformes militares e policiais de vários países da Europa Central, Europa Oriental e da América Latina. Contudo, o seu uso desapareceu ou decaíu acentuadamente na maioria dos países, incluindo na própria França onde o uso da Cocar Tricolor é agora raro, apenas se limitando aos uniformes de gala de algumas poucas instituições.

O Laço Nacional Português

Primórdios

Várias referências do século XVII e início do século XVIII, referem o verde e branco como as cores do Reino de Portugal, ou seja como verdadeiras cores nacionais e não apenas meras cores distintivas da Casa de Bragança, como são muitas vezes referidas. Uma importante referência é o Regimento que Francisco de Brito Freyre, Capitão General da Armada do Commercio, & Frotas do Estado do Brasil, manda guardar aos navios da conserva de 1665, o qual falando das bandeiras que os navios da frota devem usar, refere que os que tivessem menos de 15 peças de artilharia "usem somente nas ditas bandeiras das cores do Reino, verde e branco". Um quadro a óleo pintado na época e existente no Museu do Prado representando a Batalha de Almança em 1709, apresenta as bandeiras e estandartes dos regimentos portugueses como sendo gironados de verde e branco. A obra francesa Traité des Marques Nationales de Beneton de Morange de Peyrins, publicada em 1739, refere que echarpes (lenços ou bandas) verdes são usadas pelos Portugueses. De conhecimento mais amplo é o uso do libré verde e branco pelos empregados da Casa Real Portuguesa, sendo que uniformes verdes são também adotados por algumas unidades militares de elite, como é o caso dos regimentos de infantaria da Armada.

Como foi atrás referido, durante a Guerra da Sucessão de Espanha (1701-1715), onde Portugal entrou na defesa dos partido dos Habsburgos, os inimigos borbónicos usaram laços com as cores nacionais nas coberturas de cabeça dos respetivos uniformes, sendo esse o primeiro uso confirmado de laços nacionais. Alguns autores - como René Chartrand, na sua obra Brasil Colonial - Tropas e Uniformes 1500-1822 - defendem que as tropas portuguesas também teriam usado laços com as cores nacionais verde e branco nesse conflito, mas não apresentam evidências desse uso.

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Hipotético laço português verde e branco, que poderia ter sido usado no início do século XVIII

Em 1728, o libré de cor verde e branca da Casa Real é alterado pelo Rei D. João V, passando a ser das cores encarnada e azul, pelo motivo de que estas cores seriam as usadas pelos antigos Reis. Em 1797, estas cores encarnada e azul seriam formalizadas como cores nacionais ao serem adotadas como cores dos laços em uso pelos militares e empregados da Casa Real. No entanto, não é hoje claro, qual o foi o seu estatuto durante aquele intervalo de 69 anos. Manter-se-ia o encarnado e azul como meras cores do libré, continuando o verde e branco a serem as cores do Reino ou ganharam logo o estatuto de cores nacionais? Ernesto Pereira de Sales defende - na sua clássica obra Bandeiras e Estandartes Regimentais do Exército e da Armada e outras Bandeiras Militares - que a mudança de cores nacionais teria ocorrido numa data intermédia, por ocasião das reformas militares do Conde de Lippe, levadas a cabo de 1762 a 1764. Algumas evidências parecem no entanto mostrar que, a partir de D. João V, as cores identificativas do Reino passaram a ser mesmo o encarnado e o azul, como é o caso das talhas pintadas em diversas salas do Museu Militar de Lisboa da época deste rei, onde aparecem representadas bandeiras gironadas de azul e vermelho sobre fundo branco. Estas seriam as bandeiras usadas pelos regimentos portugueses da época, portanto substituindo as anteriores bandeiras verdes e brancas. Uma bandeira semelhante às das salas joaninas do Museu Militar aparece numa estampa da obra Bandeiras e Estandartes Regimentais do Exército e da Armada e outras Bandeiras Militares, apesar do seu autor defender que as cores verde e branca ainda eram usadas na época. Ainda no Museu Militar de Lisboa, nas salas da época de D. José I (1750-1777) aparecem representadas bandeiras de um outro modelo (campo gironado, carregado com uma cruz de Santo André contra-gironada), mas mantendo as mesmas cores vermelha, azul e branca. É possível que este modelo de bandeira regimental tenha sido o adotado durante as reformas militares do Conde Lippe. Este modelo de bandeira também aparece representado na referida obra de Pereira Sales e aparece igualmente na obra Brazões e Bandeiras do Brasil de Clóvis Ribeiro.

Apesar de ser aparentemente evidente que o vermelho e azul terem substituído o verde e branco como cores portuguesas ainda na primeira metade do século XVIII, o seu uso sob a forma de laço nacional não deve ter ocorrido tão cedo, como o demonstram várias evidências. Uma coleção de estampas existentes na Torre do Tombo, representando os uniformes usados por várias unidades militares portuguesas em 1762, mostram o uso de laços coloridos nos tricórnios dos militares. As cores dos laços parece replicar a cor da farda e respetivos forros das unidades, servindo os mesmos, quando muito, de emblema regimental e ainda não de emblema nacional. Em 1764, são estabelecidos novos uniformes para o Exército e regimentos da Armada. Os chapéus dos novos uniformes incluem um tope, todos de cor preta. Esta cor preta não tinha provavelmente nenhum significado simbólico, sendo provavelmente escolhida por ser neutra e da cor dos próprios tricórnios, ou seja por razões meramente estéticas. Apesar disso não pode ser deixada de parte a ideia de que os topes pretos poderão ter sido escolhidos por inspiração dos topes simbólicos da Casa de Hanover usados no Exército Britânico onde o Conde de Lippe havia servido.

Só em 1796, serão os topes pretos substituídos por um verdadeiro laço nacional.

O laço azul e escarlate

Em 1796, é estabelecido formalmente o primeiro laço nacional português. Por decreto de 17 de janeiro desse ano, é ordenado que os officiais e criados da Casa Real, bem como os oficiais e mais tropa do Exército passem a usar de laços nos chapéus das cores da libré, de escarlate e azul escuro. No mesmo decreto, estabelece-se que os oficiais das tropas usem de fiador na espadas de cor encarnada e oiro, terminando em borlas de seda azul e prata. As cores encarnada, oiro, azul e prata são - por coincidência ou não - todas as cores presentes no brasão português. Este decreto indicia que, para além das cores nacionais principais que seriam o azul e encarnado, as cores ouro e prata seriam vistas como cores nacionais secundárias. Talvez por essa razão, estas as quatro cores estão presentes nas primeiras bandeiras dos regimentos de infantaria e nos estandartes de cavalaria, como indicaria o decreto de 19 de maio de 1806 que estabeleceu os novos uniformes do Exército Português e onde aquelas bandeiras são genericamente descritas.

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Laço português azul-escarlate, introduzido oficialmente em 1796. A: formato usado nos tricórnios até início do século XIX. B: formato usado nas barretinas militares e bicórnios, a partir do início do século XIX. C: modelo em forma de roseta, usado nas barretinas militares partir de cerca de 1810.

O laço azul e escarlate irá consagrar-se como um verdadeiro emblema nacional durante a Guerra Peninsular (1807-1814). Nessa altura, além de ser obrigatoriamente usado pelos militares e empregados da Casa Real nos seus uniformes, o laço azul e escarlate passa a ser amplamente usado de forma voluntária e espontânea pela população portuguesa, como manifestação de patriotismo contra os invasores estrangeiros.

O laço azul e branco

Em 1820 - na sequência da Revolução Liberal do Porto - é implantada pela primeira vez a Monarquia Constitucional em Portugal, sendo eleitas Cortes Gerais, Extraordinárias e Constituintes da Nacão Portuguesa, que se reunem a partir de janeiro de 1821.

A importância do laço como símbolo nacional irá fazer com que o mesmo atraia a atenção dos deputados, tornando-se um assunto de debate nas Cortes. Na sessão de 5 de maio de 1821, o secretário das Cortes comunicou que um projeto de Francisco Simas pedindo um novo laço para o chapéu havia sido remetido à Comissão das Artes. Na sessão de 14 de agosto, o deputado Manuel Gonçalves de Miranda propôs que o Laço Nacional passasse a ser das cores verde salsa e amarelo cor de ouro e que nenhum português podesse usar outro que não o daquelas cores. Sendo o deputado Miranda membro do Grande Oriente Lusitano, do qual viria a ser grão-mestre, Apesar disso não ser referido, as cores verde e amarelo por ele propostas teriam aparentemente uma origem maçónica, apesar de isso não ser referido. O debate principal sobre este tema acabaria por ocorrer na sessão de 21 de agosto de 1821. Este debate incidiu sobre a necessidade de mudar o laço existente, sobre as novas cores a adotar e sobre quem deveria ser obrigado a usá-lo. Os deputados concordaram na conveniência de mudar as cores do laço estabelecido pelo decreto de 17 de janeiro de 1797, uma vez que o facto daquelas serem as cores do libré da Casa Real tornava-as apenas próprias para serem usadas por criados, sendo considerado humilhante e desadequado o seu uso por pessoas com o estatuto de cidadãos. Havia portanto que estabelecer um laço puramente nacional. O deputado Francisco Trigoso discordou das cores apresentadas pelo deputado Miranda, propondo como alternativa as cores branco e azul, por serem as cores nacionais, empregadas no escudo de D. Afonso Henriques. Para além da discussão das cores, o debate focou-se sobre se o uso do laço nacional deveria apenas ser obrigatório para os militares e empregados público ou se deveria ser obrigatório o seu uso por todos os cidadãos. A votação que se seguiu ao debate aprovou as cores azul e branca para o laço, a sua obrigatoriedade de uso pelos empregados púbicos e o seu uso facutativo pelos demais cidadãos, ficando a Comissão das Artes de apresentar um modelo.

Assim, pelo decreto de 22 de agosto de 1821 (executado pela Carta de Lei de 23 de agosto de 1821), as Cortes estabelecem um Laço Nacional composto das cores branca e azul, por aquelas serem a divisa da Nação Portuguesa, desde o princípio da Monarquia. O Laço Nacional seria usado no chapéu ou barretina de todos os oficiais e soldados do Exército e Armada, bem como de todos os empregados públicos civis ou militares, de qualquer ordem, graduação ou hierarquia. Era permitido também a todos os restantes cidadãos usar do Laço Nacional.

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 Laço Nacional Português azul e branco. A: formato usado nos chapéus armados dos oficiais militares e de alguns funcionários civis. B: formato usado nas barretinas e capacetes do Exército

Para ajudar a desfazer a confusão que existe hoje sobre este tema, é aqui também importante referir que o estabelecimento do laço azul e branco em 1821 não levou ao estabelecimento da bandeira nacional nas mesmas cores. Esta só viria a ser estabelecida em 1830. As cores azul e branca - com a legenda "Constituição ou Morte" - foram contudo estabelecidas para serem usadas nas bandeiras e estandartes privativos das unidades da Guarda Nacional, quando do seu estabelecimento a 22 de março de 1823.

Na sequência da independência do Brasil, no mesmo dia em que são estabelece o escudo e a bandeira nacional, através de um outro decreto de 18 de setembro de 1822, D. Pedro estabelece um Tope Nacional brasileiro, nas cores verde e amarela. Por coincidência ou talvez não, são portanto utilizadas as cores que Manuel Gonçalves de Miranda havia proposto no ano anterior para o Laço Nacional português e que haviam sido preteridas. Estas são também as cores principais de uma bandeira que havia sido projetada em 1820 - provavelmente a pedido de D. João VI, para um fim hoje desconhecido - e que viria a servir de modelo para a Bandeira Nacional do Brasil. Está ainda por ser feita uma investigação que averigue a relação entre a que viria a ser a bandeira brasileira e a proposta de cores verde e amarela para laço português.

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Laço Nacional Brasileiro. A: modelo introduzido em 1822, nas mesmas cores que haviam sido propostas em 1821 para o laço português. B: modelo normalmente usado na atualidade, acrescentado com um círculo azul ao centro

Litígio laço azul e branco vs. laço azul e escarlate

Na sequência do golpe da Vilafrancada chefiado por D. Miguel, a Monarquia Constitucional é derrubada, sendo restabelecido o anterior regime.

No âmbito da restauração absolutista, é publicada a Carta de Lei de 18 de junho de 1823, qual revoga a Carta de Lei de 23 de agosto de 1821, restabelecendo a legislação anterior sobre o tema e, portanto, restaurando implicitamente o laço azul e escarlate.

O litígio entre liberais e absolutistas irá despoletar uma guerra civil que irá durar de 1828 a 1834. 

Numa altura em que os liberais apenas controlam os Açores, o Conselho de Regência em nome da Rainha D. Maria II, através do Decreto de 18 de outubro de 1830  - justificando que o governo que havia usurpado o trono havia também usurpado as cores que haviam guiado para a vitória as tropas portuguesas - restabelece as cores azul e branca. O decreto manda que a Bandeira Portuguesa seja verticalmente de azul e branco, com as Armas Reais ao centro. Também manda que nos laços militares do Exército e Armada se usem das mesmas cores azul e branca, ocupando a branca a parte exterior e o centro do mesmo, de acordo com o modelo de laço então em uso.

Durante o período que vai de 1830 até ao fim da guerra civil em 1834 são usados dois laços nacionais em Portugal. O laço azul e escarlate mantém-se em uso no território controlado pelos absolutistas, enquanto o laço azul e branco é usado no território controlado pelos liberais. Estes dois laços ficam assim associados aos dois partidos antagonistas, passando também a serem vistos como os seus símbolos políticos.

Com a vitória dos liberais em 1834, prevalece o laço nacional azul e branco, que será usado até ao final da Monarquia em 1910.

O laço verde e vermelho

No dia 5 de outubro de 1910, é derrubada a Monarquia Constitucional e implementada a república. 

A adoção de novos símbolos nacionais é uma das prioridades do Governo Provisório da República, o qual logo a 15 de outubro nomeia uma comissão para apresentar um projeto de nova Bandeira Nacional. Esta comissão apresenta um projeto de símbolos que incluem a Bandeira Nacional, as bandeiras regimentais das unidades militares, o Jaque e Flâmula dos navios de guerra e as Armas Nacionais. A comissão não propõe qualquer modelo de novo Laço Nacional, ignorando o tema, em completo contraste com o que havia sucedido quando do estabelecimento da Monarquia Constitucional em que o laço foi o principal emblema abordado. O Governo Provisório aprova o projeto da comissão a  29 de novembro de 1910, ordenando a fabricação maciça de Bandeiras Nacionais do novo modelo, para serem usadas no dia 1 de dezembro, o qual havia sido estabelecido como Festa da Bandeira. A nova Bandeira Nacional foi sancionada pela Assembleia Nacional Constituinte, na sua sessão de abertura, através do decreto de 19 de junho de 1911, publicada no Diário do Governo n.º 141, de 20 de junho. A regulamentação deste diploma legal foi publicada no Diário do Governo n.º 150, de 30 de junho de 1911.

Apesar de não ser criado explicitamente um novo Laço Nacional, este irá ser estabelecido implicitamente através dos planos de uniformes militares. Assim, pelo decreto de 7 de agosto de 1911 é publicado o novo plano de uniformes para o Exército, o qual estabelece um modelo de laço com as cores nacionais para os chapéus (chapéus-capacete) do uniforme de campanha. Uma roseta do mesmo modelo é estabelecida para os barretes de bivaque dos oficiais e sargentos-ajudantes. Apesar do modelo não ser definido no texto os laços e rosetas são redondos com a cor verde ao centro e escarlate em redor. Implicitamente, é assim estabelecido o novo Laço Nacional nas cores verde e escarlate, apesar deste decreto apenas se aplicar ao Exército.

O Laço Nacional deixa de ter uso generalizado nos uniformes do Exército, quando os mesmos são alterados pelo plano de uniformes de 1933. Passa a ter um uso muito limitado, restringido ao chapéu armado do grande uniformes d

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Laço português verde-escarlate. A: formato usado nos chapéus armados dos oficiais do Exército e Armada até à década de 1960. B: distintivo de nacionalidade das aeronaves militares portuguesas na Primeira Guerra Mundial. C: formato usado ainda hoje na barretina do Colégio Militar. 

os generais. Este chapéu armado é descontinuado em 1969, sendo substituído por um barrete de pala que já não inclui o Laço Nacional.

A Armada mantém um uso mais restrito do Laço Nacional, o qual é apenas empregue nos chapéus armados dos uniformes de gala dos oficiais. O laço deixa de ser usado, com a descontinuação destes uniformes na década de 1960.

A partir de 1914, uma reprodução do Laço Nacional passa a ser usado como cocar das aeronaves militares do Exército e da Armada, a qual é normalmente pintada nas respetivas asas. Em 1918, este modelo de cocar viria a ser substituído pelo uso de cruzes de Cristo.

Em 1936, o plano de uniformes da Polícia de Segurança Pública (PSP) define o uso do Laço Nacional em metal branco com as cores verde e vermelha esmaltadas para uso nos barretes dos agentes policiais. O uso generalizado do Laço Nacional é contudo abolido na PSP, quando da alteração dos seus uniformes, através do plano de 1958, mantendo-se apenas o seu uso pelos guardas auxiliares. Em 1986, o novo plano de uniformes da PSP - estabelecido pela Portaria 484/86, de 3 de setembro - reintroduziria uso generalizado do Laço Nacional (referido no plano como “emblema com as cores nacionais”) nos barretes dos agentes policiais. Este uniforme aparentemente não é implementado, sendo em 1989 publicado um novo que já não prevê o uso do Laço, no local do qual aparecem as armas nacionais.

O regulamento dos uniformes do Exército, estabelecido pela Portaria 254/2011, restabeleceu o uso do Laço Nacional, mas apenas no uniforme de cerimónia da Banda do Exército.

Atualmente, o uso de Laço Nacional é extremamente limitado, sendo o mesmo praticamente desconhecido pela população portuguesa. A barretina do uniforme de gala do Colégio Militar e o boné do referido uniforme de cerimónia da Banda do Exército são aparentemente os únicos casos de uso atual do Laço Nacional.

 

Pares bandeira-laço nacional em uso em Portugal desde 1796

PeríodoBandeiraLaço
1796-1815

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1815-1821

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1821-1823

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1823-1825

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1825-1834

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1830-1910

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1910-atual

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Referências

    • FREIRE, Francisco de Brito, Regimento que Francisco de Brito Freyre, Capitão General da Armada do Commercio, & Frotas do Estado do Brasil, manda guardar aos navios da conserva, Lisboa, 1665
    • PEYRINS, Beneton de Morange de, Traité des Marques Nationales, Paris: Imprimeur-Libraire P.G. Le Mercier, 1739
    • Alvará de 24 de Março de 1764 (Uniformes do Exército)
    • Decreto de 07 de janeiro de 1796 (Ordenando que os Creados e Officiaes da Casa Real, Officiaes do Exercito, e Soldado usem de laço azul escuro, e escarlate)

    • Decreto de 19 de maio de 1806 (Aprovando o Plano dos Uniformes do Exercito)

    • Diário das Cortes Geraes e Extraordinárias da Nação Portugueza nº 152, 14 de Agosto de 1821

    • Diário das Cortes Geraes e Extraordinárias da Nação Portugueza nº 153, 16 de Agosto de 1821

    • Diário das Cortes Geraes e Extraordinárias da Nação Portugueza nº 157, 21 de Agosto de 1821

    • Diário das Cortes Geraes e Extraordinárias da Nação Portugueza nº 158, 22 de Agosto de 1821

    • Carta de lei de 28 de agosto de 1821 (Determinar como deve ser o laço nacional e as pessoas que devem ou podem traze-lo)

    • Decreto de 18 de setembro de 1822 (Estabelece o tope nacional do Brasil)
    • Lei de 22 de março de 1823 (Formar huma Guarda Nacional para defeza da Constituição e manter a segurança Publica)

    • Carta de lei de 18 de junho de 1823 (Restabelecendo a Legislação antiga sobre o Laço da que se devia usar e uniforme dos Ministros e Secretarios d'Estado e Corpo Diplomático)

    • Decreto de 18 de outubro de 1830 (Estabelecendo a Bandeira bicolor e o laço militar)
    • "Origem do Laço Tricolor" in O Panorama (Jornal Litterário e Instructivo da Sociedade Propagadora dos Conhecimentos Úteis), Lisboa, 28 de dezembro de 1839

    • CASTILLO, Antonio Canovas del, "De la Escarapela Roja" in Ilustración Española y Americana n.º XXVIII, Madrid, 5 de outubro de 1871
    • Decreto de 15 de outubro de 1910 (Nomeia uma comissão para apresentar um projeto de nova Bandeira Nacional) 
    • Bandeira Nacional: Modelo aprovado pelo Governo (provisório) da Republica Portuguesa, Lisboa: Imprensa Nacional, 1910
    • Decreto de 19 de junho de 1911 (Sanciona a nova Bandeira Nacional)
    • Regulamentação do decreto de 19 de junho de 1911, Diário do Governo n.º 150, de 30 de junho de 1911
    • Decreto de 9 de agosto de 1911 (Plano de Uniformes para o Exército)
    • SALES, Ernesto Pereira de, Bandeiras e Estandartes Regimentais do Exército e da Armada e outras Bandeiras Militares, Lisboa, 1930

    • RIBEIRO, Clóvis, Brazões e Bandeiras do Brasil, São Paulo: São Paulo Editora Ltda, 1933
    • CHARTRAND, René, Brasil Colonial - Tropas e Uniformes 1500-1822, Lisboa: Fronteira do Caos Editores, 2012 

    • Portaria n.º 484/86, de 3 de setembro de 1986 (Plano de Uniformes da Polícia de Segurança Pública)

 

JOSÉ J. X. SOBRAL

 
publicado por audaces às 23:22

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