vexilologia, heráldica e história

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No final do século XIX foi construído, em volta de Lisboa, um sistema de fortificações destinado a proteger a cidade, tanto de um ataque terrestre como marítimo. Esse sistema foi oficialmente classificado, em 1899, como Praça de Guerra de 1ª Classe, com a designação de Campo Entrincheirado de Lisboa (CEL). Concentrando a maioria do esforço militar português, o Campo Entrincheirado de Lisboa, constituiu o principal meio de defesa de Portugal durante a primeira metade do século XX. O seu sistema de fortificações acabaria por ser completamente desactivado, apenas, em 1999 !

 

Forte de Sacavém

História

Portugal viu-se, sucessivamente, sujeito a diversas invasões e intervenções militares externas, durante a primeira metade do século XIX: invasões francesas, desembarques das tropas liberais, intervenções britânicas, francesas e espanholas, etc. Os estudos, de como contrariar possíveis novas invasões, levaram, os responsáveis militares e políticos, a aperceberem-se que a defesa da totalidade do território nacional era impossível. Por outro lado, a invasão do país, sem a tomada dos principais centros económicos e populacionais seria um esforço inútil. Sendo assim, Portugal defender-se-ia, defendendo-se o seu principal centro económico, populacional e administrativo: Lisboa. Resolveu-se, então, proceder à fortificação de Lisboa. De observar que os estudos também indicavam a necessidade de algum esforço para a defesa do Porto, o segundo centro do país.

Sistemas de Fortificações Antecedentes

Já durante as invasões francesas se tinha montado um dispositivo de fortificações para a defesa da capital portuguesa, as Linhas de Defesa de Lisboa, mais conhecidas por Linhas de Torres. As Linhas de Torres foram um dos maiores e mais completos sistemas de fortificações de sempre. O sistema compunha-se de quatro linhas de defesa. A 1ª, entre Torres Vedras e Alhandra (complementada pela, chamada, Bateria do Tejo, uma flotilha de canhoneiras). A 2ª, entre a Ericeira e Vialonga. A 3ª em volta da Fortaleza de S. Julião da Barra (esta última linha, destinava-se apenas a proteger o embarque e a fuga das tropas britânicas, caso as duas primeiras fossem forçadas). A 4ª linha envolvia a península de Setúbal, protegendo as aproximações a Lisboa e à barra do Tejo pela margem sul.

Em 1833, durante a fase final da Guerra Civil, depois de tomada Lisboa pelas tropas liberais, e perante uma tentativa de reconquista pelas tropas tradicionalistas, reactivou-se um sistema de fortificações defensivas, em volta da capital. A norte do rio Tejo, seguindo o modelo das Linhas de Torres, foram criadas três linhas de defesa. A 1ª linha avançada era constituída por fortes independentes. A 2ª linha formava um anel de 11 fortificações permanentes ou semi-permamentes, complementadas por parapeitos e redutos de terra, entre Sacavém e Caxias. A 3ª linha, no interior da cidade de Lisboa, consistia num anel de fortes, redutos e baterias entre Alcântara e a Madre de Deus. Existia ainda uma linha de defesa na margem sul do Tejo, que garantia a protecção da barra de Lisboa, com fortificações na Trafaria, Monte de Caparica, Pragal e Cacilhas, com centro em Almada.

Estudos Prévios e Obras Iniciais

Em 1857, o ministro da Guerra, marquês de Sá da Bandeira, nomeia a primeira comissão que se irá dedicar aos estudos das defesas de Lisboa e Porto.

Os primeiros estudos apontam para um sistema defensivo de Lisboa com três linhas. A linha avançada, formaria um anel entre Sacavém e o Forte de S. Julião da Barra. A defesa próxima, seria baseada nas fortificações da 3ª linha das Linhas de 1833, complementadas por uma fortificação central, em Monsanto, o ponto mais elevado de Lisboa. Estava ainda prevista uma linha defensiva da margem sul, centralizada no Forte de Almada e complementada por um anel de fortificações entre a Trafaria e Cacilhas. Com base nestes estudos, inicia-se, em 1863, a fortificação da serra de Monsanto.

Em 1874, a comissão, na altura, encarregue dos estudos das fortificações de Lisboa, elabora um relatório em que é mencionada a instalação de um recinto de segurança entre Sacavém e Caxias, ao invés do aproveitamento das Linhas de 1833. Em 1876, com a morte do marquês de Sá da Bandeira, que vinha sendo o responsável pela direcção dos trabalhos de fortificações de Lisboa, e a sua substituição por Sanches de Castro, o plano de aproveitamento das linhas de 1833 é definitivamente abandonado. O novo plano, que acabou por ser implementado, previa:

1) Linha de Defesa Avançada, com fortificações em Alhandra, Sobral de Monte Agraço e Mafra;

2) Linha de Fortes Destacados, formando um anel entre Vialonga e Sintra;

3) Recinto de Segurança entre Sacavém e Caxias, com fortificações de apoio em Monsanto, Alto do Duque, Bom Sucesso e Ameixoeira;

4) Linha de defesa na margem sul do Tejo, com várias baterias, centralizadas no Forte de Almada.

No Recinto de Segurança Sacavém-Caxias estaria concentrada a maioria das fortificações e do esforço defensivo. O recinto seria delimitado por uma linha de nove fortes permanentes, interligados por uma estrada militar, protegida, ao longo do seu percurso, por um entrincheiramento, parapeitos para infantaria e posições de artilharia.  

Entretanto, os trabalhos de fortificação continuam. O Forte de Monsanto, considerado o reduto central do sistema defensivo, é terminado e classificado como Praça de Guerra de 1ª Classe, comandada por um general, do qual, igualmente dependem as restantes fortificações de Lisboa.

 

Forte de Monsanto

Criação do Campo Entrincheirado de Lisboa 

Em 1899, com os trabalhos já bastante avançados, é criado, oficialmente, o Campo Entrincheirado de Lisboa, Praça de Guerra de 1ª Classe, englobando o conjunto das fortificações que formam o sistema defensivo da capital portuguesa. Em 1901, são estabelecidos os limites do Campo Entrincheirado, divididos em dois sectores de defesa. O Sector Norte compreendia o Recinto de Segurança Sacavém-Caxias. O Sector Sul, compreendia as fortificações na margem sul do Tejo. Em 1902, com a conclusão da estrada militar entre o Forte de D. Luís I (Caxias) e o Forte do Monte Cintra (Sacavém), ficam, praticamente terminados os trabalhos de fortificação.

O Campo Entrincheirado foi organizado como um comando militar com um general governador, um estado-maior e tropas privativas de artilharia e engenharia. O seu estado-maior e as suas tropas estavam, permanentemente, num elevado estado de prontidão, sendo a sua organização e os seus efectivos em tempo de paz próximos dos de tempo de guerra. Além das suas forças privativas, em caso de ataque, a guarnição do Campo Entrincheirado seria reforçada com tropas de outros comandos militares, especialmente da 1ª Divisão do Exército, sediada em Lisboa.

Além das tropas e fortificações em terra, o Campo Entrincheirado de Lisboa, era protegido no mar, pelos meios da Marinha de Guerra atribuídos a essa função, especialmente o couraçado Vasco da Gama, que serviria de bateria flutuante contra ataques navais.

O dispositivo militar português no continente, no período entre o final do século XIX e o final da 1ª Guerra Mundial, está organizado de modo que o seu esforço se concentre na defesa do Campo Entrincheirado de Lisboa. Além do Exército, a própria Marinha de Guerra, concentra grande parte dos seus meios e do se esforço a esta defesa. As fortificações do Campo Entrincheirado recebem modernas peças de artilharia de praça, de posição e de costa de 280 mm e 150 mm. As mesmas fortificações são iluminadas por projectores e interligadas por linhas telegráficas e telefónicas, bastante avançadas para a época.

Depois do Campo

O conceito de defesa fixa assente em fortificações, em que se baseava o Campo Entrincheirado de Lisboa, torna-se obsoleto na sequência da Primeira Guerra Mundial. Pela organização do Exército de 1926, o Governo do Campo Entrincheirado de Lisboa, funde-se com o comando da 1ª Divisão Militar, dando origem ao Governo Militar de Lisboa. O Governo Militar de Lisboa, além de funcionar como região militar, passa a encarregar-se das fortificações de Lisboa. A maioria destas, no entanto, deixam, sucessivamente de ser utilizadas como tal, sendo transformadas em depósitos, paióis e prisões.

Durante a 2ª Guerra Mundial, perante a ameaça de uma agressão externa, são reorganizadas as defesas da capital portuguesa. Além de defesas terrestres e de costa, é instalado um complexo sistema de defesa antiaérea, que torna Lisboa, uma das cidades mais bem protegidas do mundo, comparável a Londres, durante os ataques da Luftwaffe. Apesar de, há muito, ter deixado de ter utilidade militar, só em 1965 é, formalmente, extinto o Recinto de Segurança Sacavém-Cacilhas. No entanto, algumas das fortificações costeiras, do antigo Campo Entrincheirado, mantém-se activas, guarnecidas pelas batarias do Regimento de Artilharia de Costa, só sendo desactivadas com a extinção deste em 1999. 

 

Forte da Ameixoeira

As Fortalezas do Campo

O Recinto de Segurança do Sector Norte do Campo Entrincheirado de Lisboa acabou por ficar constituído por seis fortalezas principais, instaladas em Monsanto, Alto do Duque, Bom Sucesso, Caxias, Ameixoeira e Sacavém.

Forte do Marquês de Sá da Bandeira - Monsanto

No alto da serra de Monsanto foi instalada a fortaleza central do sistema defensivo, baptizada como Forte do Marquês de Sá da Bandeira - também conhecida por Forte de Monsanto ou Reduto Central de Monsanto. Este forte consistia num reduto circular de três andares, coberto por uma cúpula de betão à prova de bomba. A cada andar correspondia uma bataria. Devido à forma circular e à elevada posição ocupada, a artilharia de cada bataria podia bater um perímetro de 360º.

Forte do Alto do Duque

Também em Monsanto, mas mais a sul, foi construído o Forte do Alto do Duque, destinado a bater a barra do Tejo com a sua artilharia, complementando o Forte do Bom Sucesso, na função de defesa costeira do Sector Norte do Campo Entrincheirado. Construído entre 1875 e 1890, o forte consiste num reduto central circular enterrado, coberto com uma cúpula, rodeado por um corpo pentagonal irregular.

Forte do Bom Sucesso

Ao lado da Torre de Belém, o Campo Entrincheirado dispunha do Forte do Bom Sucesso – igualmente conhecido por Bataria do Bom Sucesso – assegurando a defesa da barra do Tejo. O forte tinha sido construído no século XVIII, mas sofreu grandes obras de modernização entre 1870 e 1874.

Forte de D. Luís I - Caxias

Constituindo o ponto extremo esquerdo do Recinto de Segurança do Sector Norte, foi construído, em Caxias o Forte de D. Luís I – também conhecido por Forte de Caxias. O forte, constituído pelo Reduto Norte e pelo Reduto Sul, destinava-se a cobrir o flanco esquerdo do Recinto de Segurança. Além de assegurar a defesa terrestre do flanco, a sua posição sobre o mar, permitia-lhe contribuir para a defesa costeira.

Forte de D. Carlos I - Ameixoeira

Ocupando o centro do perímetro do Recinto de Segurança do Sector Norte, foi instalado no alto da Ameixoeira, o chamado Forte de D. Carlos I – também conhecido por Forte da Ameixoeira. O Forte destinava-se a assegurar a defesa terrestre do Recinto de Segurança, em conjugação com os fortes de Caxias, Monsanto e Sacavém.

Forte do Monte Cintra - Sacavém

Em Sacavém, ocupando o ponto extremo direito do Recinto de Segurança do Sector Norte, foi instalado o Forte do Monte Cintra – também conhecido por Reduto do Monte Cintra ou Forte de Sacavém. Construído entre 1875 e 1893, o forte destinava-se a assegurar a defesa terrestre do sector, batendo, com a sua artilharia, a área entre o mesmo e o forte da Ameixoeira e as principais vias de comunicação de acesso à capital: a Estrada Real para o Norte e o caminho de ferro. A sua posição, sobre o Tejo, permitia-lhe igualmente interditar o estabelecimento do inimigo na margem sul e impedir um atravessamento do rio, pelo mesmo.

Forte de Almada

A defesa do Sector Sul do Campo Entrincheirado de Lisboa, tinha como missão principal, impedir o estabelecimento do inimigo na margem sul do Tejo, protegendo assim a barra de Lisboa e a própria cidade. Esta defesa estava centralizada no Forte de Almada, que, caso as outras fortificações fossem tomadas ou neutralizadas, funcionaria como último refúgio. Construído sobre o antigo castelo medieval, o Forte ocupava o alto da então vila de Almada, num penhasco sobre o Tejo. A sua posição, permitia-lhe igualmente participar na defesa costeira, batendo o rio e reforçando a artilharia Forte do Bom Sucesso.

 

Forte de Almada

A Defesa pelo Mar

Tal como foi, anteriormente, referido, a defesa do Campo Entrincheirado de Lisboa tornou-se a grande prioridade do dispositivo militar português. Não só, nela, foi empregue a maioria dos meios e da força do Exército, como até a Marinha de Guerra lhe atribuiu uma parte importante dos seus meios.

O principal meio para essa defesa, atribuído pela Marinha, era o couraçado Vasco da Gama. Adquirido em 1887, propositadamente para esse fim, o Vasco da Gama destinava-se a operar como uma bateria flutuante - com as suas duas peças de 203 mm e uma de 150 mm – protegendo, a entrada da barra de Lisboa, contra ataques marítimos.

Para interdição do porto de Lisboa, a Marinha de Guerra equipou-se também, a partir de 1881, com uma esquadrilha de torpedeiros e encomendou, em 1907, o seu primeiro submarino. Foi igualmente activado um Serviço de Torpedos Fixos (minas marítimas).

A Estrada Militar

Construída entre 1863 e 1902, a Estrada Militar do Recinto de Segurança do Sector Norte – também conhecida por Estrada Militar Caxias-Sacavém ou Estrada Militar de Defesa de Lisboa- servia de delimitação ao próprio recinto e constituía uma das suas componentes fundamentais. A Estrada Militar ligava as fortificações permanentes e complementares do perímetro exterior do Recinto de Segurança, sendo protegida ao longo do seu percurso, por um entrincheiramento contínuo, com parapeitos para a infantaria. O seu percurso era pontuado por diversos redutos, baterias, fortins, posições de artilharia e outras obras de fortificação.

A Estrada Militar nascia no Forte D. Luís I, em Caxias, passando em frente a Queijas, dirigindo-se ao Vale do Jamor, atravessando-o, cortando, depois, a estrada Carnaxide-Queluz, subindo à serra de Alfragide, seguindo pela frente da Damaia até Benfica, depois, continuando para a encosta da Paiã e, depois até à Calçada de Carriche. Depois da Calçada de Carriche, continua até perto do Forte de D. Carlos I, na Ameixoeira, seguindo depois, pela encosta do vale de Sacavém, atravessando-o, depois, passando sobre o canal do Alviela e terminando no Forte do Monte Cintra, em Sacavém.

De observar que, entre Benfica e Sacavém, a Estrada Militar desempenhava, também, a função de Estrada de Circunvalação, definindo os limites fiscais e administrativos do concelho de Lisboa. Entre Algés e Benfica, a função de Estrada de Circunvalação de Lisboa era desempenhada pela Estrada de Circunvalação Fiscal – actual Estrada da Circunvalação de Algés.

 

 JOSÉ J. X. SOBRAL

publicado por audaces às 19:09

procuro por moncorvo, lugar que consta como nascimento de minha avó, preciso tirar a certidão de nascimento dela mas preciso descobrir a freguesia dela.
walkiria a 10 de Abril de 2010 às 01:29

Boa tarde... gostaria de saber onde é possível encontrar informações sobre as baterias do exército, nomeadamente as de Alpena e da Raposeira. Desde plantas dos edifícios e mais história sobre as mesmas. Sou estudante de arquitectura e pretendo fazer um projecto no topo da arriba fóssil da costa da caparica.

Cumprimentos,
Filipa
Filipa a 24 de Maio de 2010 às 18:48

Boa noite. Estou a fazer uma tese sobre a Circunvalação. Poderia me fornecer as fontes deste artigo? Ficaria grato.
paulo a 14 de Fevereiro de 2011 às 00:52

Havia algum forte/fortificação em Benfica. freguesia de Lisboa?


Obrigado
Vítor Vieira a 15 de Junho de 2012 às 11:10

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